terça-feira, 25 de outubro de 2016

Sessão de terapia

Era só para gritar e bater na almofada ao mesmo tempo.
Para mim, era como ter que empurrar alguém que estivesse diante de mim.
Silêncio e expectativa no picadeiro.
Como o palhaço que banaliza o espetáculo que anuncia, meu quase grito banalizou a cena.
Seria cômica se não fosse dramática.
Soluços irromperam, meus olhos cerraram num deságue sem fim. Atrás deles, era o avesso do espelho, era negro, era solitário. Minhas vias pareciam bloquear e tornar a vida rarefeita. Não queria sufocar. Que medo de sufocar!
A voz me chamava de volta, tentava me trazer à tona para o outro lado.
Meu peito ardia.
Soltar a minha voz era como agredir alguém. Minha voz...
(Oh, o quanto calei? Quanto de mim deixei voar? Era a descoberta de uma prisão?)
Meu peito ardia.
Por trás dos olhos, uma criatura verde musgo, pontiaguda, magra, de pele gosmenta, calma e segura de seu poder, estava parada. Seu peito se abria, alguém tentava desesperadamente romper aquela casca. Senti o sufoco e a força para romper aquela casca.
Era eu parada ali. Era eu tentando sair da casca. Era eu, dupla.
Soltar a minha voz era agredir alguém. Soltar a minha voz era necessário.
Num auxílio, afundei. Senti cada parte afundar num aconchego. Aos poucos, retomava a respiração. Aos poucos, voltava para frente do espelho. Aos poucos...

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Da estreita varanda do 11º andar, vi a igreja ao longe. Daquela varanda que mais parece um umbigo estufado, me deleitei com o calor dos raios solares. Vinha ao meu encontro aqueles raios. Sentada, vi aquele céu dramático em que o vento espalhava densas manchas cinzas no azul cortês. Os raios de sol zombavam do drama e se projetavam numa espécie de dança entre claro e escuro.
O vento tornava dramático os meus sentidos já tão sentidos. Ora era um frescor doce, ora era um frio pontiagudo a me cutucar. Um encontro inócuo intensificava a melancolia poética daquela varanda. E o céu refletido no vidro, tornava-se cada vez mais dramático visto daquela varanda.


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Hoje tentei desenhar as imagens que ficaram na minha cabeça. Os desenhos não chegaram nem perto do requinte de detalhes que as imagens possuem na minha cabeça. Aparentemente, não sei desenhar. Melhor, sei desenhar, mas com traços primitivos e infantis. Talvez eu pinte melhor que desenhe. Mas eu nunca pintei.