segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Quando a vida vem

Somos amigos há mais de uma década, mas ainda somos jovens. Eles são 3, cada um individualmente mais um que é o "dois". A amizade perdura com os três, sempre arejada pelo vento da intensidade. Eu e os outros amigos que completam a patota ficamos imaginando horas a fio como seria o dia em que o "dois" deixaria de existir. Porque a gente faz parte da história, da vida que alimenta o "dois". A conclusão é lógica: façam o favor de não se separarem para não arranjarem problemas para a gente!

A patota é das melhores. Um grupo de amigos manés que topam as melhores coisas e fazem das ideias mais banais ou estapafúrdias os melhores encontros. Desde um amigo oculto de canecas até um festival de sorvete com casquinha de flor e tudo. Um grupo de pessoas sem vergonha de viver, de experimentar, de vivenciar. Puro aconchego.

Era para ser um festival de sorvete, que dava sequência aos encontros iniciados com a noite de queijos e vinhos, seguido do festival de cerveja. Um encontro temático só para nos encontrarmos. Mas nossos encontros tem sempre um quê de comprometimento. Por isso, teve bandeirinhas primaveris, caldas de frutas de verdade, sabores exóticos, casquinhas de flor, salpicão (salgado refrescante), mímica e trote. Uma delícia só para um domingo nublado.

Mas eis que uma mímica mudou tudo. Nossas vidas nunca mais serão as mesmas. O milagre da multiplicação aconteceu. E não foi pão e nem sorvete. Foi muito melhor que isso. Foi a vida. A mímica "minha mulher está grávida" fez a gente pensar que filme era esse (ãh?) e como trouxas, com caras de irrealidade, percebemos que a brincadeira na verdade era um pique esconde. Ficamos o resto do dia de ontem e talvez ainda alguns dias mais, embasbacados porque teremos mais um. E nem estávamos preparados para um acréscimo de doçura em nossas vidas.

Festival de sorvete? Mais calda, por favor!


*E eu ainda me sinto como o cursor piscando.

Silêncios

Não sei lidar com o silêncio.
Ele grita nos meus ouvidos o incerto, o vazio em que tudo cabe, tudo pode.
Quanto cabe num silêncio?
Quanto se diz num silêncio?
Um universo inteiro de possibilidades pensáveis, sentíveis, confundíveis.
Medo, tristeza, desencontro, engano, expectativa frustrada,
ânsia, desajeito, dor,
contentamento, comodidade, segurança,
vergonha, desejo,
incerteza, desconfiança, amarras,
pulo do gato.
Tudo que se esconde no silêncio mói a minha carne.
Agudos penetrantes.
Imóvel, aguardo a tempestade passar.
O desejo devia fazer mais barulho.

sábado, 9 de agosto de 2014

Da palavra

É engraçado como algumas fichas caem como um gole seco de cachaça - forte, amargo e rasgando. Mas depois, dá aquela sensação de apuro às papilas gustativas, uma sensação de clarividência. Meu irmão diz que comigo as coisas tem de ser todas explicadinhas. Minha mãe costuma dizer que eu deveria ser advogada porque é um perigo discutir comigo. "Você sempre consegue virar as coisas pro teu lado, depois que começa a falar." Outras pessoas me chamam de inteligente e outras só de tagarela. Mas hoje... Hoje eu ouvi outra coisa e até demorei a entender. "Você escreve, cara! Você escreve o tempo todo na tua cabeça e muitas vezes eu me perco..." Eu escrevo o tempo todo na minha cabeça?! Desceu que nem cachaça.

E eis-me aqui, agora, escrevendo na cabeça, no papel. A mea culpa está dada:eu sou da palavra, do molejo dos sentidos e significantes desses desenhos que são as letras. Não sei bem quando ela se tornou meu guarda-chuva, meu guarda-sol, mas o que parece ser fato é que eu escrevo o tempo todo. E se não escrevesse, seria qualquer coisa que nem tem cabimento imaginar. Palavra.


*transcrito de um papelzinho.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Negligência

Não sou dessas que espera as coisas acontecerem, por pura preguiça. Não sou dessas que fingem que não vêem, que não sentem e que não se importam. Não sou. Mas nos últimos tempos a vida tem andado fora do tempo, arrastando dores, sentimentos. E apressando o relógio da rotina, do cotidiano. E eis que me encontro suspensa no ar tentando retomar a mim, os meus desejos, os meus sonhos, os carinhos que deixei, o rascunho de vida que tinha esboçado. E descubro que não posso fazer isso sem ser, ao menos um pouco, negligente. Porque não se pode pegar tudo de uma vez, ao mesmo tempo. Tenho só dois braços e um coração. Minha negligência grita silêncio, clama sono prolongado recheado de sonhos conturbados. No espelho eu reflito uma serenidade que é, na verdade, dormência. A lista de coisas importantes a fazer continua ao lado do teclado, olhando sorrateira para mim. Brigo com as correntes para poder fazer o que é certo, mas ainda sim estou negligente. E não só com o resto do mundo, mas comigo mesma.

No início do segundo tempo, descubro agora que negligência às vezes é uma necessidade que se impera. Que alguns momentos pedem mãos frouxas, coração vagaroso, olhos entreabertos. Em alguns momentos a gente não cabe. E as ações mais elementares hesitam. Nos últimos tempos fiquei gaga. Decidi não brilhar, não ser, não estar. Negligente? Hoje sou dessas. Do contrário, como eu poderia me refazer? Juntar os cacos e formar um mosaico? Também, sou dessas.

Peço perdão pela ausência e pelo vazio consistente que deixei em alguns lugares. E com essa mea culpa, aviso que a negligência não alcançou de todo o mais importante do momento. Aviso que eu estou voltando.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Aos amores!

Hoje é dia dos namorados, mas bem que podia ser o dia do amigo. Assim, antecipado. Ou melhor, uma prévia. Nada contra aos namorados e às namoradas, só a favor dos amigos.
Meus amigos e amigas, o meu amor vai pra vocês que fazem da minha vida um lugar de coisas belas!

Hoje, em especial, Ju, Sussu, Nessa e It!

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Rascunhos de romance


 I. O silêncio dos olhos

Falavam-se com a frequência que a vida do dia a dia e a saudade permitia. Às vezes se viam por alguns minutos, às vezes por horas. O tempo ainda não passara forte como vento que enverga os galhos das árvores e por isso o querer ainda era tudo o que existia ali. Destes encontros colhiam-se sorrisos, meninices, meiguices e algumas fantasias, nem sempre doces nem sempre ardidas. Sobretudo, tudo era leve e fugaz como bolha de sabão. Um suspense infinito até a explosão de todas aquelas cores que bailam no ar.

A distância de vidro que os separavam se fizera no instante em que se conheceram. O caminho em que se cruzaram era o mesmo que os levavam para direções diferentes. Talvez isto, o brilho da passagem ou a incompletude do encontro tornara tudo tão intenso, tão singular. O acaso faz mesmo tudo ser mágico. E era esta magia que encobria os sentimentos que se armaram como chuva de verão naquele sete de setembro.

Mas estas são informações para que você, leitor, não se encontre perdido naquilo que me interessa contar. Interessa-me que saibas sobre o silêncio que imperava alguns segundos naquelas conversas, naqueles encontros. Havia momentos intensos em que tudo silenciava para que os olhos pudessem dar liberdade para aqueles desejos e sentimentos profundos de que a gente tem medo de pronunciar. Porque uma vez pronunciados em voz alta é preciso ter culhões para dar-lhes consequência. No silêncio dos olhos não. Fica tudo como uma partilha de segredo cochichado ao pé do ouvido enquanto se escondem embaixo da mesa ou de baixo do lençol. Ou como murmúrio de sono que acompanha o abraço de conchinha.

E aquele tempo de silêncio era como um balde de eternidade fria, gelada de doer os ossos. Não houve nenhum outro momento entre os dois em que se disse tanto do que existia ali. No silêncio dos olhos se amavam imensamente.


sexta-feira, 16 de maio de 2014

Saudade seca

Não vem com desejos dos tempos de outrora,
nem com a fina melodia da melancolia.
Tampouco se apresenta com ares de nostalgia.
É como pinga boa,
forte, de um amargo seco e um
calor que queima as tripas.
Não vem cheia de lembranças e lamento.
É a falta mais pura,
mais grosseira,
mais dura.
É a falta de um braço que não existe mais.
Saudade seca é o vazio
que habita um corpo mutilado.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Engasgo

Tusso, tusso, tusso
e não me passa esse engasgo
de palavras para nomear o que sinto,
o que me toma.
A possibilidade de me sufocar, me apavora.
Engasgar é pura angústia.

Felicidade

Porque tanta gente andou me perguntando por felicidade:


sexta-feira, 2 de maio de 2014

Surpresa

Em dias cinzentos uma borboleta pode passar e te fazer sorrir.
Em dias de sol, a gente também pode se deparar com uma baita careta e com isso, sorrir.
Pequenas surpresas que fazem a alma dançar...

terça-feira, 22 de abril de 2014

Fortalezas

Quando eu tinha sete anos eu arrumei um namoradinho na escola. Não sei hoje como está o recém saído CA/jardim de infância, mas naquela época ter um namorado era algo super badalado e ingênuo. Nós, as crianças, namorávamos por cartinha. Eram cartinhas prometendo amor eterno, com corações, acompanhadas de um doce, carinho e muita vergonha. Não lembro quantas vezes de fato eu entreguei pessoalmente alguma cartinha para o meu namorado Fábio, só lembro que eu achava ele um luxo só. Tinha olhos verdes, cabelinho russo penteadinho de lado. Ele era dois anos mais velho que eu, estava na 3ª série, e sua sala tinha a porta de frente para a minha. Todo mundo queria namorar ele ou alguém como ele, sua aparência era muito polida. Não sei como e nem porquê ele se encantou por mim, justo eu que mais parecia uma maria-dormideira de tão sem graça. O fato é que ele se encantou, me enviou uma cartinha de amor e logo começamos a namorar. Tudo era um sonho até que me deparei com o primeiro grande desafio da vida escolar: um convite para resolver lá fora alguma pinimba.

É bom que se entenda algumas coisas sobre aquela época. A primeira delas é que eu estudei dos 3 aos 5 anos numa escolinha perto da primeira casa em que vivi. Os meus 6 anos se passaram longe da escola porque eu não podia ingressar tão jovem na primeira série e tampouco fazia sentido repetir o CA. Mas essa não só era uma escola nova depois de um ano sem escola, era também uma escola num lugar completamente desconhecido, pois ficava numa outra parte do bairro. Era também uma escola de verdade, grande, de vários andares, com muitas crianças, muitas turmas. A minha turma era a 106. Isso mesmo, seis turmas de primeira série! Era um mundo novo e assustador.

E com estes dois pontos chegamos a questão desta história: o medo. Para aprender a lidar com o assombro que aquele novo espaço representava para mim, eu enchia o peito e pedia a professora a licença de sair da sala para falar algo importante com a minha prima. (Uma prima minha também estudava na escola.) Seguia até a sala da minha prima, interrompia a aula e pedia pra falar com ela. Eu não tinha nada importante pra dizer, sequer tinha tanta simpatia e intimidade com minha prima. Não éramos super amigas, só primas. A verdade é que eu só queria ver um rosto familiar e sentir que ali era um lugar no qual eu sobreviveria. Depois caminhava de volta a minha sala para seguir a vida. Cada vez que eu fazia isso, meu corpo se desfazia por dentro de tanto medo da "Tia" não deixar ou brigar seriamente comigo por interromper a aula. Mas nunca tive problemas e acho que sempre representei bem o papel.

De volta ao namoradinho, aconteceu que ele tinha uma irmã muito da ciumenta que jurou que arrebentaria a cara da menina que ousava namorar com ele. Vejam bem... Eu era uma menina de sete anos, mais fina que um poste. Apelidos como magrela, Olívia Palito e esqueleto humano me fizeram companhia toda infância. Eu fui a primeira da fila durante sete anos. Não só era a mais magra como a menor de todos os alunos da minha turma. Qualquer um era maior que eu e podia me quebrar em duas. Quando a Fabiana disse que me arrebentaria, eu ouvi. Foi no recreio e ela ainda não tinha certeza que a tal menina era eu, só sabia que era alguém do meu grupinho de amigas. Eu vi e ouvi ela e sinto medo até hoje com aquela lembrança. Minhas amigas perguntavam o que eu iria fazer. Um bilhetinho chegou até mim com a data, a hora e o local marcados para a briga. Meu coração disparou, minhas pernas tremeram (eu acho). Só pensava que não só apanharia dela como também da minha mãe. Eu era boa aluna, sempre fui. Brigar significava sair da linha e decepcionar a minha mãe. Nossa! Quanto sofrimento! Se eu fugisse, aquela escola gigantesca cairia sobre mim...

No local, data e hora marcada eu estava lá. Enquanto por dentro eu me desmilinguia toda, por fora eu posava de segura e superior. Ela veio com um jeito marrento me fazendo perguntas do tipo "Então você é a namorada do meu irmão?! Como você tem coragem? blá blá blá". E eu apenas disse que ele é quem foi atrás de mim e que, portanto, ela tinha era que brigar com ele. Talvez tenha dito também que tinha pena dele ter uma irmã maluca como ela que queria só bater em todo mundo. O fato é que ela não esperava por aquilo e logo a marra toda se desfez. Não só não brigamos como um tempo mais a frente nos tornamos super amigas. Um mérito: nunca briguei com alguém na escola.

E hoje, eu me encontro com a árdua tarefa de carregar essa armadura que em algum momento criei. Uma fortaleza inteira para esconder as pernas bambas, o suor frio, as incertezas, os medos. Tornei-me muito boa em manter uma segurança convincente quando por dentro o mar está de ressaca. Bem verdade que isso funciona muitas vezes para o meu bem. O problema é que eu ainda não aprendi fazer diferente e essa "segurança" muitas vezes assusta quem eu quero perto e bem. A moral da história é que é melhor ter filtros do que fortalezas.







sexta-feira, 18 de abril de 2014

Saudade

Quando o tempo pesa.
Quando a distância se mede em anos luz.
Quando o ar é rarefeito.
Quando os músculos do coração se contraem ad infinitum, coração miúdo.
Quando os olhos viram oceano.
Quando o sorriso amarga.
Quando a garganta vira Saara.
Quando os pés não pisam, areia movediça.
Quando basta só um sorriso, um afago, um beijo, uma palavra ou um olhar para o mundo voltar ao normal.
Saudade...

quarta-feira, 12 de março de 2014

Partida

Saudade que floresce antes da primavera e exala melancolia.
Um apego que gruda mais que Super Bonder.
O sufoco de lágrimas pelo medo do que ficará no caminho.
Uma balança de três pratos de expectativas.
Um sentimento de solidão em pleno carnaval.
Um travesseiro que não abraça, não dá um cheiro e nem dá colo.
Não vou ao paraíso. É para a terra mesmo.
Mas existe uma cortina de nuvens no qual poderei flutuar.
Nisto reside o impulso para o salto.
Estou de partida...

sábado, 8 de março de 2014

Mulheres de Atenas

Era um dia feliz. Eu tinha passado na casa do meu pai para pegar algum dinheiro, pois iria viajar para Brasília, participar do V Congresso Nacional do MST. Era uma honra ter conseguido as condições para esta participação, que só foram confirmadas na quarta véspera do feriadão. Eu e mais três amigas viajaríamos no domingo pela manhã.

Era feriadão, mas o ponto de ônibus da passarela 06 da Av. Brasil estava lotado de gente. Eu estava ali para pegar o ônibus para ir para minha casa, depois de ter falado com meu pai. Enquanto esperava,  um homem me abordou de forma educada, pedia ajuda. Disse que precisava passar um saco de drogas para uma pessoa com quem tinha marcado, mas precisava disfarçar porque havia uma viatura da polícia  perto. Pediu que eu falasse com ele sobre qualquer coisa. Lembro que na hora não tive medo de início, pensei apenas que logo estaria livre, assim  que meu ônibus chegasse.  Não foi o que aconteceu.

O tom dele oscilava entre paciente e grosseiro, um jogo sutil de ameaças que começou a me deixar apavorada. Eu olhava em volta e só pensava como era possível alguém achar normal aquele tipo ao meu lado se eu havia chegado e ficado ali por um bom tempo. Não era obviamente alguém que eu tratava como pessoa conhecida, mas como estranho. Ficava olhando ao redor,  esperando que alguém pudesse entender a minha cara de pavor e fizesse alguma intervenção. Eu, uma menina de 21 anos, feliz, com mochila nas costas, ali, num local que só conhecia de passagem, que parecia seguro, mas não era. 

Ele tinha uma bicicleta, que eu não tinha visto. Disse que como a viatura permanecera lá, que era para eu acompanhá-lo até o posto de gasolina, que ele deixaria a droga lá. Que havia combinado com o cara que supostamente esperava, depois de atender a ligação. O posto era perto, ainda sim tinha movimento de pessoas por lá. Pensei em ir pra me livrar logo, eu já estava bem amedrontada. Ninguém veio para me salvar. Parece que todo mundo achou muito normal uma menina de jeans e blusa de alcinha com um cara de meia idade, magro e um pouco maltrapilho.
Ele não parou quando chegou no posto. Não deixou eu descer da bicicleta. Fez ameaças e acho até que me agrediu de algum modo. Lembro de entrar já com lágrimas nos olhos na imensa escuridão que tinha depois do posto. A rua estava completamente escura e quase deserta. Ele dobrou a direita. Era uma rua cheia de casas, pessoas na calçada, crianças correndo. Um pouco escura, poucas luzes dos postes estavam acesas - a iluminação vinha mais das casas. Virou à direita de novo e acenou amigavelmente para um cara, que estava sentado numa cadeira dessa esquina. Parou ao lado de uma igreja evangélica. Lembro de sentir um certo alívio por isso, já que parecia que eu não seria estuprada.

No início, ele ainda manteve a farsa da droga. Disse que nós esperaríamos o cara ali. Que era para fingir que nos conhecíamos. "Pediu" para ficar com a mão na minha cintura, eu de frente pra ele. Um culto era celebrado na igreja. O culto acabou, as pessoas saiam e eu olhava com uma cara de socorro. Tinha vontade de gritar, mas a voz não chegava na goela. Todos me viram, todos se foram. Esse foi o momento em que ele virou Homem. 

Lembro de deixar a voz dele longe dos meus ouvidos. Não sei o que disse, sei que era agressivo. Abriu a bermuda, pegou a minha mão e colocou no pênis dele e foi movendo-a continuamente. Abriu meu sutiã, para tocar meus seios por cima da blusa. "Pediu" para eu colocar a língua para fora da boca e começou a chupá-la. Meus olhos fechados com tanta força como se pudessem me transportar para outro lugar. Eu tremia, meu estômago se revirava, minhas pernas quase se desfaleciam. Alguma coisa saiu, melecou a minha mão um pouco. Parecia ser o fim.

"Pediu" para eu fechar o sutiã de novo, seguir em frente e não olhar pra trás. Robótica, eu fui. Não sei bem quando comecei a chorar, mas lembro do que ele esbravejou: "Porque você está chorando?! Eu não fiz nada com você.". Segui até o ponto de ônibus novamente, vi que meus pais tinham ligado para meu celular incessantemente. Olhei à esquerda e vi que a viatura ainda estava lá. Não tinha forças para falar qualquer coisa. Peguei qualquer ônibus que pudesse me deixar na Av. Brasil, na altura de Guadalupe. Liguei para casa e disse a minha mãe que estava tudo bem, que meu irmão fosse me buscar na Brasil e que em casa eu explicaria o que aconteceu. Foi um dia...

A imagem que tenho daquele homem é fantasiosa. Lembro apenas que ele tinha rosto e nariz finos e a pele marcada. Talvez uma cor de pele amarelada, como de alguém doente. A imagem que tenho na minha cabeça é a do Freddy Krueger. O rosto de verdade, a lembrança dele, o trauma fez questão de levar para os cantos mais obscuros da minha memória. Durante alguns anos, eu passava mal cada vez que passava na Av. Brasil pela passarela 6. Hoje, meu coração só palpita um pouco e sempre peço no meu íntimo para nunca mais encontrar com ele.

Não sinto ódio, não sinto compaixão. O sentimento em relação aquele homem é de indiferença. O que sinto de verdade, é um lamento por esse nosso mundo gerar seres humanos assim - e não me venham chamá-lo de monstro ou animal, ele é produto de uma sociedade machista, violenta, autoritária. Acredito num outro projeto de sociedade, onde possamos realizar nossos desejos e potencialidades sem o uso da força contra outrem, contra outras.

Feliz Dia da Mulher Rosa Choque para você que não dorme e nem vive com as infinitas possibilidades de ser tratado apenas como objeto de dominação!

Feliz Dia de Luta (mais um) para nós Mulheres que sabemos quanta opressão ainda resta para enfrentar!




domingo, 23 de fevereiro de 2014

Moleza

A vida ainda não está normal. Já existe uma certa paz de espírito, mas ainda nada voltou aos eixos. Ainda tem muito sono acumulado, um cansaço infindável, uma moleza no corpo que dá vontade de ficar como quando a gente boia - seguindo a maré...
Já ouvi música, já dancei, já dormi com tanta gente, comi churrasco, abracei e sorri. Mas tudo isso ainda é pouco. E de verdade, o ciclo ainda não se fechou. Ainda, ainda e ainda. Este tempo que se arrasta e deixa um rastro viscoso na vida me dá uma moleza que talvez só o carnaval pode acabar.



terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Infinito

E quantos amores a gente não cultiva nesta vida? Quantos deles ficam com a gente como sinal na pele?
E quantos mais se almeja?
E ainda tem tanta gente com medo de marcar minha pele, de se deixar estar no meu pomar de amores... Mal sabem do bem num piscar de olhos.
Que boa esta sensação de felicidade ao se dar conta de como um bom cultivo pode render tão lindos frutos. Sorriso de canto de boca, paz de espírito e gosto de prazer na boca. Pura entrega, puro deleite, mar de intensidade, infinito de estrelas.

Desentendimentos

Não entendo essa gente que quer falar e não liga, não escreve, não desenha. Não entendo essa gente que quer e coloca empecilhos. Essa gente que me pede compreensão (infinitamente!), mas não me pergunta se realmente estou num lugar melhor para poder compreender os erros e as faltas alheias. Essa gente que se disponibiliza a ajudar e não ajuda, que diz sentir saudade e não procura, que diz o quanto sou importante pra elas, mas que demonstra essa importância com ausência e silêncio. Essa gente de leão e de gêmeos, que ignora que há um limite pra tudo, inclusive pra dedicação e paciência de aquário.

A distância une, mas não hesita em separar.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Morte súbita

E agora, caros leitores, começa o tempo de morte súbita! Muita tensão na finalização desse jogo... Começando em 3, 2, 1...

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Buraco

Sempre sofri ausências no aniversário. Nunca minha turma teve alguma chance de cantar parabéns pra mim no meio de uma aula. Poucas vezes ganhei presente de natal e de aniversário. Mas sempre amei comemorar cada ano que o tempo levou e cada nova chance de poder fazer diferente. Foi só há alguns dias que talvez o meu níver mais esperado da vida chegou e sinto como se não fosse, como se ele mesmo tivesse faltado desta vez. Tinha tanta coisa que queria naquela sexta, tanta gente, tantos risos, tanta música, tantos abraços, tantos beijos, tanta alegria, tanta beleza. Muita coisa boa e linda compareceu, mas o vazio parecia dançar na minha frente e me sacanear. Doeu.

Agora que sei que vou embora, sei também que meu medo de perder os meus laços é do tamanho de um buraco negro.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Apego

Agora que sei quando vou partir, sei também que meu apego é maior que a Lua cheia.
Dói.

domingo, 19 de janeiro de 2014

Porre de melancolia: iogurte ao invés de jantar; olhos fechados no banho; camisola sem calcinha; Maria Bethânia na rádio uol; a busca por algo de útil pra fazer; choro escondido. Vontade de ficar suspensa no ar.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Cabo de força

Duas fortalezas que se cruzam e se chocam. Um tremor imenso de terras.
Dois andarilhos que se juntam numa dança - o andar sobre o mesmo eixo.
Um salto ornamental numa piscina de plástico e um pulo com boias no mar.
Todo risco, toda imprevisibilidade, toda distância traz a proximidade.
Quem dera o vento soprasse sempre no meu rosto. Quem dera eu pudesse bailar com ele.
Quem dera a gente soubesse se deixar levar, deixar ser, deixar estar.
Ao invés disso, cabo de força.
Movimento de rotação.
Terezinha de Jesus e o terceiro cavalheiro.
A torcida de um braço que ficou na garganta, a escolha como um escudo de vidro e um lamento de dor.

Desvio

Eu podia ter mentido, mas gosto de liberdade. E pra quem conheceu pouco os grilhões da culpa, a mentira é quem mais acorrenta. Por isso, o alívio da verdade.
Eu podia ter seguido as regras, mas as exceções às vezes correspondem tão melhor a minha realidade. E pra quem desde sempre teve que reescrever a própria história, o desvio é regra. Por isso, a displicência.
Eu podia me desesperar, mas é que a maturidade emocional tá aqui. E pra quem desde o primeiro amor aprendeu a sofrer, a possibilidade da perda é um a priori. Por isso, a serenidade.
Eu podia renegar meus desejos, mas minha filosofia de vida é contra a autoviolência. E pra quem é consciente de todo o processo de repressão, o princípio do prazer é um imperativo.



*Dos guardados.

Caderninho de anotações

Daí que em 2011 comprei um caderninho de anotações e fiz de agenda telefônica  porque as agendas custavam uma fortuna. Daí que usei ele pra tudo. Daí que encontrei uma anotação que não é minha e que deduzo o autor pela letra, mas não lembro como foi parar lá e nem porquê. Daí que virou poesia esbarrar com isso num dia comum.

****

Assim como os pássaros migram para a Argentina, o sol se levanta a cada dia, principalmente quando comemos feijão e não escovamos os dentes!

domingo, 5 de janeiro de 2014

Ih, ficou picante!

Depois de 3 anos de flores, o Contato resolveu ficar arretado. Primeiro o blog nasceu com a simplicidade e beleza leve das margaridas, aquela que levou Fausto a fazer pacto com o querido Mefistófeles. Depois resolveu mudar para a embriaguez da flor do ópio. E agora, resgatando as minhas raízes de povo quente - Você já foi a Bahia, meu bem? Não? Então, vá! Lá tem... -, tasquei-lhe pimenta para tudo quanto é lado. O quarto ano de vida desse cantinho aqui começa anunciando que quero contatos picantes, calientes por demais. Porque é bom um quentinho gostoso, um sabor de fazer o corpo todo reagir.

E nesse clima de toda-cheia-de-si, fica aí uma apresentação arretada da gente, Contato e moi.









*Ah! As flores ainda estão no rodapé.

Dezembro

Dezembro começou com um medo dos grandes, que se dissolveu como espuma. Da iminência de com tudo acabar, só acabou mesmo foi com o ano. Dezembro de cuidados, de amor, de calma, de serenidade e de pequenos acertos. Dezembrou bem, como um tango nordestino - prometeu exigência e apresentou malemolência. E terminou com um post it de amor...

Ano Novo - uma mensagem clichê

Quando me despedi de 2012 e dei boas-vindas a 2013, fui ingrata com 2012 e joguei tantas expectativas para 2013 que se o ano velho tivesse boca teria dado uma bela gargalhada da minha cara depois de dizer "Coitada! Mal sabe o que a espera!". E foi assim que 2013 foi o ano mais difícil que já vivi, tão difícil que já me lembro de 2012 como um ano super leve - outro dia me peguei pensando "De que diabos eu reclamava de 2012?". Passei a semana da virada refletindo sobre isso, dando algumas voltas na minha cabeça para tentar inverter esse ciclo vicioso absurdo que a gente entra. Minha tentativa: uma mensagem clichê + uma forcinha do Drummond.

******
Ano Novo, para pintar

Todas as expectativas do mundo, exceto as dos chineses, comparecem no mesmo dia e na mesma hora local. A contagem regressiva anuncia o lançamento de todo anseio, de toda expectativa, de todo furor e de uma boa dose de coragem. Estão todos reunidos ali, no momento em que um novo ciclo começa. O Ano Novo que se aproxima os evoca. E ele sempre aparece assim, com letras maiúsculas porque este é seu nome próprio.

Eis que ele, Ano Novo, chega. Mas as expectativas que jogamos sobre ele são um erro infantil. Tão infantil que elas se desvanecem já no primeiro mês. Mais ainda, chegamos ao final com a arrogância de avaliar o que o ano fez de bom ou não. Ora, o que é o tempo, presente e futuro, senão uma tela em branco? Devemos pintá-lo, escrever a nossa história, cruzar com outras, colaborar com parceiros e, sobretudo, convocar a coragem para realizarmos todas aquelas expectativas e assim transportá-las à tela.

O Ano Novo chega vazio, sem pretensões, mas aberto ao devir. Ele vem com o vento, leve, firme e seguro. E sempre nos convida a levantar a poeira, bagunçar a vida, dá voltas para vermos as coisas de ângulos diferentes, passear por outros mundos, voltar intempestivamente, soprar... Mas isso é sempre um convite, uma provocação, não mais que isso.

Aceite a provocação do novo, ocupe seu espaço na tela do tempo e pinte com o vento!
Ano Novo para ser feliz!


*****

Receita de Ano Novo

(Carlos Drummond)

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra
birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta ou recebe mensagens? passa telegramas?).

Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um ano-novo que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.


****

2014 começou assim, leve, calmo e aberto.
Previsões, só até o carnaval.
Desejos, só o de seguir.
Realizações, as que puderem existir.
Expectativas, só a de mudança.