domingo, 5 de maio de 2013

Onde habita o feminino

Aquilo bateu em mim como uma facada no útero...
(E desde quando o útero dá conta do que é o feminino?)

A primeira vez que conheci o sexo, beirava os 20 anos de idade. Foi uma escolha livre e consciente de o conhecer somente quando o meu corpo encontrasse a liberdade de ser corpo, de pulsar em seu desejo e não no alheio. Para isso nenhum príncipe precisava existir, nenhuma ilusão de que a primeira vez devia ser fruto do amor. Era uma questão prática, mas também de sentimento íntimo por mim mesma - o mais difícil de alcançar.
Conhecer o sexo... Que posso dizer além de um trocadilho tosco, mas verdadeiro - foi um prazer! Foi o primeiro passo na conquista do feminino. Ainda era uma menina, madura, mas menina... Um rascunho mal desenhado de uma mulher. Não queria ser mulher. Assumir esse nome que nada tinha com um rosto infantil, um corpo infantil - o mesmo desde os 14 anos de idade. (Ainda hoje me pergunto se o cara com quem transei a primeira vez não tinha um certo gosto pedófilo.) Eu não queria mesmo era crescer, arrastar as correntes da vida adulta - vida de trabalho, de sobrevivência, de sofrimento. Como o tempo é inexorável e devastador, não resisti por muito tempo e nem sem dores.
O que mais gostei do sexo foi me realizar, despertar partes desconhecidas e deixar o corpo falar. E como o corpo fala... Mas não foi o sexo que me tornou mulher. O contato com o universo do masculino é que me fez mulher, mais do que isso deflorou o meu feminino. Mas não no que se pode pensar em termos de uma "ordem natural" das coisas. Foi na limitação do masculino, no seu inevitável cansaço, na sua pequena morte de prazer que me vi tão incompleta e tão insatisfeita.
O feminino, que antes julguei tão limitado, mudou de tom, de cheiro, de sabor e de sentido quando me toquei. Por que ao toque precede o desejo, a sedução, o irresistível, o apreço, o afeto. É preciso que o feminino se torne a contento, que tenha contorno, adorno, maciez de ser. Ali, eu me fiz mulher! Livre, independente, leviana e banida do paraíso.


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Há muito vinha desejando uma aparição. Um rosto suave de sorriso largo e olhos reluzentes como de uma coruja. Uma aparição que me roubasse da minha vida por um tempo e me jogasse em mares que eu nunca naveguei. Uma aparição que do lugar do feminino me conduzisse a um prazer de tantas fantasias.



Ontem em meio a tanta coisa estranha, tanta gente de outro planeta, tanta diversão com nada, num lugar tão fora de lugar, encontrei um cantinho tão quentinho num sorriso. E o sorriso vinha acompanhado de uma mulher com jeito doce de menina, uma descontração, um lamber de lábios antes das palavras, uma gentileza que se fazia próxima. Deus! Como me senti atraída por aquela mulher?! Um sentimento estranho de desejo e de desconcerto. Queria que tudo ao redor ficasse em suspenso para poder conhecer aquele cantinho e quem sabe descobrir um mundo ali. Ao mesmo tempo não tinha ideia do que ser. Um medo de invadir aquele espaço, de não reconhecer o limite - de certo algum limite havia.
Nunca estive com alguma mulher, mas há tempos já conheço o feminino. Gosto do feminino. Em relação a mulher, não se trata de curiosidade, nem de safadeza, nem preconceito, nem repressão. Trata-se de ocasião. Nunca uma ocasião favoreceu um encontro desejoso. Nunca até ontem. De minha parte, ficou a vontade, um querer mais. De ambas, uma possibilidade de contato qualquer, trivial.
Hoje, meu corpo deseja imensamente aquele lugar: corpo leve, gentil com o espaço, risonho de ocasião e convidativo em interesse. Meu ventre queima e agua, meu coração acelera enquanto mil fantasias inocentes passam pela minha cabeça. Não posso imaginar seu corpo. Nenhuma visão em detalhes além de rosto, cabelo e mãos foi possível. E me pergunto como pode ser tamanha reação...

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"É preciso ter ainda um caos dentro de si para gerar uma estrela que dança."
"No mundo as melhores coisas nada valem se não houver alguém que as ponha em cena." (Nietzsche)





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